Debate-se no Congresso Nacional proposta de emenda constitucional que tramita na casa desde 1993 para reduzir a idade em que pessoas podem ser punidas criminalmente para menos de 18 anos.
Desde a criação do Estatuto da Criança e Adolescente foi marcante o embate entre entidades de defesa de direitos humanos, que trabalham com crianças, adolescentes e jovens junto à esquerda em geral contra setores conservadores junto com difuso apoio da mídia corporativa. O resultado manteve a situação atual, e garantiu as vitórias representadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990.
A questão é retomada pelo “Congresso mais conservador desde 1964” (segundo o DIAP), em momento oportuno para ser aprovada. Ao que tudo indica os conservadores vencerão.
A questão é tratada a partir de argumentos parciais, constituindo-se em uma defesa demagógica de combate à violência e à impunidade. Aceita pela maioria da população segundo pesquisas, a redução da maioridade surtiria efeito exemplar, inibiria o cometimento de crimes por menos de 18 anos, supostamente acobertados pela impossibilidade de penalização. Pensa-se que são inúmeros estes casos, à ponto de efetivamente reduzir a criminalidade.
Os problemas são baseados na falta ou manipulações de informações, em que a mídia corporativa é uma das grandes protagonistas.
O número de crimes cometidos por jovens com menos de 18 anos é ínfimo, em relação ao geral (menos de 1% segundo ministério da justiça), portanto o efeito destas medidas não necessariamente reduz a criminalidade. Mas este quadro é matizado pela superexposição de casos isolados, de crimes cometidos por menores, pela mídia e pelos setores conservadores que se interessam em ampliar nossa população carcerária.
Os jovens com menos de 18 anos estão submetidos ao Sistema Nacional Socioeducativo (previsto no ECA), um sistema muito mais voltado à socialização do que à punição, que ainda não se consolidou, principalmente por falta de orçamento suficiente. Afinal, o que se quer é justiça e ressocialização para evitar o crime ou vingança e punição para se eliminar um segmento social?
As prisões são ineficientes para o que foram criadas pelos menos desde sua invenção. Sempre servirão para segregar parte da população. A criminalização recai mais sobre pobres, trabalhadores e trabalhadoras do que sobre quem comete os piores crimes, basta ver o perfil de nossa população carcerária. São pobres, pretos de periferia em sua esmagadora maioria.
Há um forte lobby da indústria do crime, que inclusive defende a privatização de presídios para lucrar ainda mais com as políticas de criminalização. O exemplo dos EUA é marcante. Lá a indústria de armas promove a guerra e a indústria penitenciária produz a maior população carcerária do mundo. Com 300 milhões de habitantes os EUA tem mais gente presa do que a China com 1.3 bilhões de habitantes, veja a desproporção.
Portanto, temos um grave problema cultural, educacional, de comunicações, de política criminal, que passa pelo mundo do trabalho (pela definição política de que parte da classe trabalhadora ficará nas penitenciárias), em que se caminha para tratar um problema social como um problema de polícia.
O momento de polarização que vivemos no país é bastante explicativo. É revigorada a diferença política entre direita e esquerda, entre progressistas e conservadores. Ao contrário do que muitos dizem estas diferenças nunca deixaram de existir, contudo as posições à esquerda e à direita disputam a hegemonia dos espaços, instituições, grupos e segmentos de nossa sociedade. Como os partidos, por exemplo, que são majoritariamente de direita ou majoritariamente de esquerda, nunca absolutamente de um lado ou de outro. Neste caso não há dúvidas, a defesa da redução é uma defesa da direita. É um dos reflexos da conhecida luta de classes.
Em movimento contrário à redução da maioridade penal, tivemos a notícia, esta semana, da nomeação de uma pessoa de esquerda para comandar o Ministério da Educação, para enfrentar novos embates desta mesma luta de classes. Tomara que ele contribua para que nossa pátria deixe de ser incriminadora para ser efetivamente educadora.
Marcel FarahEducador Popular
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