Quem é realmente contra a corrupção não aposta em impeachment, eufemismo para golpe, aposta na Reforma Política.
Em primeiro lugar, não há dúvida que a presidenta não só não é corrupta como não é tolerante com a corrupção.
No caso do chamado Petrolão, por exemplo, coube a Dilma e a Graça Foster a demissão da diretoria das Petrobrás, que foi colocada e altos cargos já nos tempos do PSDB, a qual se verificou depois ser corrupta. Na investigação determinada pelo Procurador Geral, Dilma, ao contrário de Aécio, sequer foi citada.
Nessas circunstâncias, propor o impeachment, sem nenhum fundamento jurídico, da presidenta recém-reeleita é golpe puro e simples.
Mas a atual luta contra a corrupção não se assenta apenas nas inegáveis qualidades pessoais de honestidade e honradez da presidenta.
Na realidade, ela se fundamenta, sobretudo, numa política consistente de combate institucional às causas da corrupção no Brasil.
Ao contrário do que o ubíquo neoudenismo concebe, a corrupção não se combate com indignação serôdia e moralismo seletivo e politicamente motivado.
O verdadeiro e consistente combate à corrupção se dá fundamentalmente mediante o fortalecimento dos órgãos independentes de controle e pela promoção da transparência na administração pública. Com isso, enfrentam-se as causas mais imediatas e diretas da corrupção.
Pois bem, nenhum governo investiu mais nessa política consistente de combate aos desvios que os governos do PT.
Os dados a esse respeito são inequívocos.
As operações especiais da polícia federal passaram de ao redor de 6 ao ano, nos governos do PSDB, para cerca de 250 ao ano, nos governos do PT. Nas duas gestões de FHC, tais operações somaram somente 48. Nas gestões Lula e Dilma, tais operações especiais já ascendem a 2.226.
A Controladoria Geral da República, motivo de chacota pública no governo anterior ao de Lula, tornou-se uma eficiente instituição que fiscaliza com rigor as verbas federais destinadas aos municípios.
As procuradorias e o Ministério Público foram igualmente fortalecidos e, hoje, desempenham suas funções com independência e desenvoltura. Extinguiu-se a triste figura do “engavetador-geral”, com a escolha de procuradores independentes, indicados pelo corpo técnico das instituições. O mesmo aconteceu no âmbito da Polícia Federal, que passou a ser dirigida por delegados sem vínculo político com o governo, como aconteceu nos tempos do PSDB.
O notável fortalecimento do Judiciário, ocorrido em período recente, também contribuiu para que os ilícitos fossem apurados com maior rigor e celeridade.
Ao mesmo tempo, com a criação do Portal da Transparência, a Lei de Acesso à Informação e outras medidas semelhantes, a administração pública federal tornou-se muito mais receptiva ao “detergente da luz do sol”, para usar a expressão famosa do juiz Louis Brandeis.
Mas não é só isso.
O governo do PT também vem contribuindo para o combate à corrupção ao atacar causas indiretas, mas profundas, do fenômeno.
Em países como o nosso, a corrupção tem forte correlação com a privatização do Estado, a cidadania de baixa densidade e os altos índices de desigualdade pobreza.
O Estado brasileiro foi frequentemente capturado por interesses privados e, como tal, não operava para o bem comum e o grosso da população, historicamente excluída de direitos e das políticas estatais. Saliente-se que esse caráter excludente e patrimonialista do Estado foi, em alguns casos, exacerbado pelas políticas neoliberais, que consolidaram uma espécie de neopatrimonialismo e tentaram desconstruir os núcleos republicanos do aparelho estatal.
Além disso, o caráter relativamente recente do processo de construção da nossa democracia tende a tornar o aparelho estatal relativamente infenso ao controle social. Isso era agravado por uma “cidadania de baixa densidade”, ocasionada pelos históricos processos de exclusão econômica, social e política, e por índices muito altos de desigualdade e pobreza.
Pois bem, os governos de Lula e Dilma iniciaram um processo de “desprivatização” do Estado, direcionando fortemente as políticas públicas para o combate à exclusão econômica e social da maioria da população. Concomitantemente, geraram também um processo lento, mas seguro, de construção e fortalecimento de cidadania, que tende a colocar o aparelho estatal sob a égide e controle de um verdadeiro interesse público, e não mais sob o tacão de alguns interesses privados dos grupos secularmente dominantes.
O fundamental, contudo, é que governos Lula e Dilma iniciaram uma verdadeira revolução social no Brasil, retirando cerca de 36 milhões de pessoas da pobreza extrema e propiciando a ascensão à classe média a cerca de 42 milhões de cidadãos brasileiros.
Essa melhoria substancial das condições de vida da população antes desassistida, inclusive no que tange às oportunidades educacionais, também tende, de forma indireta, a arrefecer a ocorrência do fenômeno da corrupção no Brasil. O país tem hoje uma cidadania mais crítica e reivindicadora, que é o fundamento último de qualquer ação de controle efetivo do Estado. Os programas sociais e as outras medidas de combate às desigualdades e à pobreza, ao contrário do que se disse nos últimos anos, fizeram emergir cidadãos mais atuantes e conscientes de seus direitos.
Toda essa política sólida de ataque às causas diretas e indiretas da corrupção e dos desvios fez aumentar, é óbvio, as denúncias e as investigações sobre o tema.
A mídia neoudenista e conservadora apresenta tal fenômeno como algo negativo, um sintoma de um suposto aumento da corrupção no país. Não é verdade.
Na realidade, trata-se de um fenômeno muito positivo para a nossa democracia. O que realmente aumentou, de forma exponencial, foi a capacidade das instituições de controle e da própria cidadania de controlar o Estado e de combater os desvios.
O Brasil não vive, como se diz vulgarmente, uma “crise de corrupção”. O Brasil vive o processo doloroso, mas necessário, do fim da sua histórica impunidade.
Não é o “mar de lama”, do qual gostam tanto de falar os neoudenistas. É um rio que está passando pela vida do país, limpando-o.
Porém, a luta efetiva contra a corrupção, mal histórico do Brasil, está apenas começando. É necessário avançar muito mais. É preciso, sobretudo, transformar a revolução social ocorrida nos últimos 12 anos no Brasil numa revolução política.
Assim sendo, o próximo e essencial passo é a Reforma Política. Com efeito, tal reforma é fundamental para limitar a influência avassaladora do poder econômico sobre o sistema de representação e o aparelho do Estado. Ela é essencial para colocar as instituições e políticas públicas a serviço do cidadão comum e dos setores populares e, dessa forma, desatar, em definitivo, as amarras políticas ao nosso desenvolvimento ditadas pelo patrimonialismo, o presidencialismo de coalizão, a sobrerrepresentação de interesses dos grandes grupos econômicos e tantas outras mazelas do Estado brasileiro.
Portanto, quem leva o combate à corrupção a sério não se deixa enganar pelo neoudenismo e seu moralismo seletivo e politicamente motivado. Ele não dá respostas racionais à questão, apenas vocifera contra a corrupção que já está sendo combatida.
Por trás dele, estão forças francamente reacionárias que não estão realmente interessadas em combater desvios, mas apenas em desestabilizar um governo legítimo e em rever as próprias políticas que vêm possibilitando a luta consistente contra as causas da corrupção.
Quem é verdadeiramente contra a corrupção e os desvios não quer golpe contra o governo que vem atacando esse mal em sua origem.
Quem é realmente contra corrupção quer a Reforma Política, o aprofundamento das políticas que vêm revolucionando socialmente o Brasil e, sobretudo, o respeito ao mandato legítimo de uma presidenta séria e honesta.
Quem é contra a corrupção, é Dilma.
Marcelo Zero
Sociólogo, especialista em Relações Internacionais e membro do Grupo de Reflexão sobre Relações Internacionais (GR-RI)
Nenhum comentário:
Postar um comentário