quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Manutenção do veto ao Ato Médico é vitória da saúde

O polêmico projeto de Lei do Ato Médico (nº 268/2002), atualmente Lei Federal 12.842/2013, trata da atualização da regulamentação da profissão do médico no Brasil. Salienta-se a palavra “atualização”, pois foram inúmeras as leis criadas na vasta história da Medicina com fins de delinear a atuação do profissional médico no país.


Desde a sua criação há 10 anos, o PL do Ato Médico é apontado pelos profissionais quem representam 16 profissões da saúde regulamentadas no Brasil (pejorativamente denominados “não médicos”) como inimigo da saúde pública e do trabalho em equipe multidisciplinar.

A aprovação do PL do Ato Médico significaria muito mais do que interferir na atuação dos profissionais da saúde inseridos no contexto da saúde pública e privada no país, significaria referendar um modelo de atendimento da saúde em uma perspectiva tecnicista e biologista, simplificando o paciente em um conjunto de aparelhos: digestivo, circulatório, muscular e outros, e desconsiderando aspectos sociais, psicológicos, funcionais e outras singularidades do ser humano.

As relações de trabalho no Sistema Único de Saúde também ficariam prejudicadas, o médico se tornaria o grande chefe de uma hierarquia que não deveria existir. O centro de um modelo que não comporta exclusividade.

Atualmente qualquer pessoa pode recorrer diretamente a um fisioterapeuta, psicólogo, nutricionista, fonoaudiólogo, ou qualquer outro profissional da saúde. E na história do país sempre foi assim. Se os vetos presidenciais ao projeto de lei do Ato Médico fossem derrubados pelo Congresso Nacional, o paciente teria que passar por uma avaliação médica diagnóstica para poder recorrer a qualquer um desses serviços. Ou seja, seria atividade apenas do médico os diagnósticos psicológico, nutricional e socioambiental, e as avaliações comportamentais e das capacidades mental, sensorial, percepto-cognitiva, funcionais e psicomotores. Uma prática morosa e de alto custo que significaria um retrocesso, sem falar nas conseqüências para a população que sofre por falta de atendimento qualificado.

Um dos trechos mais polêmicos do PL aprovado pelo Congresso, vetado pela presidenta Dilma Rousseff, em 10 de julho, definia ser privativa dos médicos a formulação do diagnóstico e a respectiva prescrição terapêutica. A derrubada dos vetos poderia afetar 2 milhões de postos de trabalho em serviços públicos e privados que atendem pelo SUS.

As profissões da saúde que teriam sua atuação gravemente atingida, tais como: Psicologia, Terapia-Ocupacional, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Enfermagem, Nutrição, Optometria, Educação Física, Biologia, Acupuntura, Fitoterapia, Radiestesia, Massoterapia, as Práticas Corporais e a Terapia Comunitária das terapias naturais, dentre inúmeras outras afetadas indiretamente, defendem e sempre defenderam a integralidade na oferta dos serviços de saúde, um dos princípios básicos dos SUS, que considera a pessoa na sua totalidade, e entendem que as relações profissionais devam ser horizontalizadas, isto é, ocorram no mesmo nível sem a hierarquização proposta pelo PL.

A manutenção dos vetos na madrugada do dia 21 garante a autonomia de todos os profissionais da saúde. É uma vitória das profissões e profissionais da saúde, conquistada durante muitos anos de luta, principalmente neste ano, nos meses de julho a agosto, onde as categorias se mobilizaram e foram às ruas pela qualidade dos serviços prestados no setor público e privado. Desde 2002, foram dezenas de audiências públicas, seminários e debates que provaram o quão lesiva à saúde brasileira seria a prática do modelo proposto, hegemônico e corporativista, por esta única classe profissional.

Cabe salientarmos que a população brasileira também saiu vitoriosa, quiçá a maior beneficiária de todo este exaustivo, porém salutar processo de luta. Venceu a hegemonia histórica de uma minúscula classe “dominante” que desde os primórdios da nossa colonização detinha o poder. Venceu a pequena, porém barulhenta banda podre da mídia que ainda insiste em defender o lado errado da moeda, ou seja, os mais abastados. Venceu o medo de exigir qualidade e direitos constitucionais.

Em suma, profissionais e pacientes que viveram na prática este momento histórico podem se orgulhar em dizer que participaram ativamente em 2013, da construção do “Ano da Saúde Brasileira”. De um novo período para o nosso país em que a preocupação maior será a saúde coletiva. Doa a quem doer.



Walkes Vargas
Psicólogo, Presidente da Comissão Regional Eleitoral do CRP – 14ª Região MS, Diretor do Sindicato dos Psicólogos do Mato Grosso do Sul e Militante da Pastoral da Juventude.

João Leite P. Júnior

Fisioterapeuta, Pós-graduado em Gerontologia, estudioso da saúde pública há mais de 12 anos.

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