sexta-feira, 19 de julho de 2013

A idade do crime: o paradoxo da violência contra a juventude e a redução da maioridade penal

“A violência se liberou de qualquer fundamento ideológico” Hans M. Enzensberger

Ao mesmo tempo em que a grande mídia e seus pseudo- especialistas tentam pautar uma discussão sobre o encarceramento de jovens e adolescentes em cadeias comuns e a redução da idade mínima para serem julgados como criminosos adultos, o país passa por um período de sangrenta guerra que vem, ilegitimamente, exterminando sua juventude.

A violência urbana, enquanto representação simbólica da realidade em que estamos imersos, hoje se encontra num constante processo de assimilação como prática comum nas relações sociais. Ao mesmo tempo, a mídia apresenta a violência como espetáculo e como verdadeira paranoia, como se todos os ambientes, se todas as cidades, se todos os espaços, principalmente públicos, fossem espaços violentos.  Percebe-se aí a tentativa de uma construção hegemônica de estabelecer a ordem social como forma de vida constituída pelo uso da força como princípio organizador das relações sociais. Todo e qualquer questionamento à “ordem social” hegemonicamente estabelecido deve ser combatido com uso da força. Neste jogo de “cabo de guerra”, a face mais visível e, ao mesmo tempo, mais vulnerável é a juventude brasileira.  Nesta conjuntura, onde estão inseridos os aparelhos estatais de controle social? Onde se insere o debate pela implementação e efetivação de políticas públicas? Há que se considerar uma verdadeira reorganização das agencias da ordem estatal, a relação destas com a sociedade civil e a formulação e implementação de políticas mais democráticas de segurança pública.
Se alastram pelo país iniciativas de leis municipais que privam os jovens e adolescentes do uso do espaço público. Chamada de “toque de recolher”, a lei limita os adolescentes e jovens de ocuparem os espaços públicos. Mais de 90% dos casos de violência contra jovens e adolescentes são cometidos em casa, muitas vezes protagonizados pelos próprios pais ou parentes próprios. Ou seja, no ambiente privado, própria casa, é que a maioria dos crimes acontecem. Porque, então,o espaço público deve ter restrição de uso? A lei do toque de recolher torna-se, então, um atestado de incompetência do estado, através de seus gestores, que afirmam não ser capazes de tornar seguros os espaços públicos. É a privatização destes espaços.
Já o índice de homicídios na adolescência e juventude vem aumentando a cada ano. Ousamos dizer que é um verdadeiro extermínio da juventude brasileira. No Brasil, a possibilidade de um jovem  ser vítima de um homicídio é em média 30 vezes maior que na Europa e 70 vezes maior que na Grécia, Hungria e Inglaterra.  Os homicídios, no Brasil, têm idade, raça, classe social e gênero: são jovens, negros, pobres e homens.  No período de 1996 a 2006, a taxa de homicídio entre a população em geral cresceu 20%. Na população jovem este índice foi de 31%. Se considerarmos os jovens negros, este índice é ainda maior.
Segundo o relatório do IHA (índice de homicídios na adolescência), pesquisa realizada pela UNICEF, 45% das mortes de adolescentes e jovens na faixa etária de 12 a 18 anos são por homicídio, ou seja, quase metade da juventude que está morrendo é vítima da violência direta, morte por arma de fogo.  Comparado a 83 países o país ocupa o 5º lugar na taxa de homicídios juvenis.
Neste contexto em que a juventude vem sendo, verdadeiramente, exterminada, um outro movimento toma força. O debate da redução da maioridade penal. Um dos argumentos é a impunidade do ECA (Estatuto da Criança e Adolescente) que prevê, no máximo, três anos de recolhimento em centros de sócio-educação e outras medidas de acompanhamento.
A maioria dos condenados por homicídio qualificado pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) recebe como pena cerca de 12 anos de condenação. Pela legislação atual, se o condenado tiver bom comportamento poderá cumprir a pena em regime aberto após o 2º ano de prisão. Ou seja, o adulto condenado por homicídio qualificado cumpre uma pena menor que o adolescente. Outro dado importante diz respeito ao índice de crimes cometidos por jovens e adolescentes no país: 1,7%. O estado onde este índice é mais alarmante é o de São Paulo, aonde o índice não chega a 4%.
Há que se estabelecer um debate aprofundado acerca do tema, com a análise destes e de outros dados como, por exemplo, o volume de recursos que o estado vem investindo no que diz respeito a políticas públicas para a juventude.  Se há falta de investimento em políticas públicas para que estes jovens e adolescentes não venham cometer crimes, quem é o verdadeiro vilão da história? Vamos combater as causas da violência ou continuar punindo os verdadeiros inocentes no processo?



Luiz Fernando Rodrigues é funcionário da educação pública do Paraná e secretário de juventude da CUT-PR.

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