Era uma vez mãe que só tinha uma filha e tudo dessa mãe era para essa filha, a relação entre a mãe e a filha era bonita e bem próxima. No ano de 1978, na região Nordeste, nasceu outra filha que foi morar no meio dos/as mais pobres e excluídos/as da sociedade. Depois em 1982 nasceu uma filha que foi morar na escola e em 1983 mais uma filha veio ao mundo e essa foi morar no campo.
A mãe dessas jovens sempre gostou muito de casa cheia, enfeitada e bem colorida, daí ela adotou outros/as filhos/as, algumas até que nasceram em outros países.
A primeira filha depois do nascimento das três irmãs e da adoção dos/as filhos/as precisou repensar a sua vida e o seu espaço, dessa forma em 1996 ela renasceu depois de alguns anos refletindo sobre a sua identidade e o seu projeto de vida. Essa filha nunca saiu da barra da saia da mãe e tinha a missão de lembrar as irmãs de sangue e cuidar da sua identidade, visto que a convivência com os/as irmãos/as adotivos/as era cada vez mais próxima. Para lembrar suas irmãs de sangue ela sempre olhava para o seu lindo anel de compromisso.
As quatro irmãs usam esse anel para nunca esquecer o seu compromisso pela libertação dos/as mais excluídos/as da nossa sociedade.
A filha que foi morar no meio dos/as mais pobres ficou muito próxima dos políticos, porque como bem sabemos, nesses lugares falta tudo: moradia, saúde, saneamento, infra-estrutura, lazer, educação, trabalho, etc. Vale ressaltar que essa filha não se aproximou de qualquer político, ela ajudou na construção de projetos políticos populares e participativos que garantissem mais vida ao povo mais empobrecido e oprimido.
Aquela filha que foi morar no meio dos/as estudantes prometeu que iria morar numa escola pública, mas na verdade fez moradia em escolas privadas e na sua maioria ligada à sua mãe, dessa forma ela não ficou tão distante da família.
A caçula que foi morar no campo ficou distante da mãe, dos políticos e da família, visto que é muito difícil alguém chegar até lá, então ela foi se aproximando dos movimentos sociais organizados e seu nível de consciência crítica sempre foi bem aguçado e às vezes um pouco radical.
Quando a mãe reunia as quatro filhas legítimas era uma confusão, cada uma trazia dos lugares onde estavam os seus gritos, desafios e lutas, também partilhavam as suas alegrias e os seus sonhos. A filha mais velha sempre ouvia piadinhas: “Filhinha querida da mamãe”, “protegida”, “Metida”... Mas a irmã mais velha, e mais nova ao mesmo tempo, entendia o porquê das brincadeiras, afinal de contas, ela imaginava o quanto era difícil sair de casa para morar em lugares tão desafiadores, ao tempo que ela tinha certa inveja da liberdade e da autonomia das irmãs, pois ela sempre foi a mais controlada e a mais vigiada pela mãe.
A mãe sempre esteve preocupada com o relacionamento das quatro filhas e também do relacionamento delas com os/as filhos/as adotivos/as e sobre essa ultima relação a mãe escreveu um livro no ano de 1995, mas até hoje ainda é um desafio para a mãe e para os/as filhos/as se reconhecerem como família e compreender as fronteiras e as pontes dessas relações que devem sempre gerar vida, respeito, amor e unidade.
Hildete Emanuele Nogueira de Souza
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